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Para Jane Cooney Baker, morta em 22/01/1962



e então você se foi
me deixando aqui
num quarto com uma cortina rasgada
e o Idílio de Siegfried tocando no radinho vermelho.

você se foi tão rápido
tão subitamente quanto quando você veio pra mim,
e nós tínhamos dito adeus antes,
e quando eu estava limpando seu rosto e lábios
você abriu os maiores olhos que eu já tinha visto
e disse “Eu devia saber
que era você”
e você me reconheceu 
mas não por muito tempo
e um homem velho com pernas brancas e finas
na cama ao lado
dizia, “Eu não quero morrer,”
e seu sangue veio de novo
e eu o aparei com as mãos em concha
tudo o que ficou
das noites e dos dias também,
e o homem velho ainda estava vivo
mas você não estava
nós não estamos.

e você foi como você veio,
você me deixou tão rápido
você já tinha me deixado várias vezes antes
quando eu pensava que isso me mataria
mas não
e você sempre voltava.

agora eu desliguei o rádio vermelho
e alguém no apartamento ao lado bate uma porta
a sentença final: eu não vou te encontrar na rua
o telefone não vai tocar, e nenhum movimento vai
me deixar em paz.

não basta que haja várias mortes
e que esta não seja a primeira;
não basta que eu viva mais muitos dias,
talvez até muitos anos.

não basta.
o telefone é como um bicho morto que
não vai falar. E quando falar de novo será
sempre a voz errada agora.

antes eu esperava e você sempre entrava
porta adentro. agora você vai esperar por mim.


Para marilyn m.


deslizando intensamente sobre luminosas cinzas,

alvo de lágrimas de baunilha

seu corpo certeiro acende velas para os homens

em noites escuras,

e agora sua noite é mais escura

do que podem as velas

e nós vamos esquecer você, de alguma maneira,

e isso não é justo

mas os corpos reais estão mais perto

e enquanto os vermes resfolegam por seus ossos,

de modo que eu gostaria de lhe dizer

que isso acontece a ursos e a elefantes

a tiranos e a heróis e a formigas

e aos sapos,

ainda assim, você nos trouxe alguma coisa

um tipo de pequena vitória,

e para isso eu digo: bom

e deixe que larguemos mão do pesar;

como uma flor seca e jogada fora,

esquecemos, relembramos,

esperamos. criança, criança, criança,

ergo minha bebida um minuto inteiro

e sorrio.



Ela era minha amante


agora é a minha vez
acima do campo verde
bolhas de sangue,
meu corpo
carne em um grande gancho;
nomes, cidades, sonhos,
agora é a minha vez,
eu vi todos partir
amigos e amantes;
eu assisti o pianista tocar
depois que a platéia saiu
agora é a minha vez de ir,
todas as grandezas cabendo em um dedal,
pra baixo,
pra baixo
com elas, com ela,
cidades tomadas e sepultadas

Eu provo as cinzas da sua morte


as florações agitam
água súbita
por minha manga,
água súbita
fresca e limpa
como neve –
enquanto as espadas
de caules afiados
avançam
contra seu peito
e as doces selvagens
rochas
saltam por cima
e
nos prendem.









Um poema para a velha dente-podre



conheço uma mulher
que segue comprando quebra-cabeças
quebra-cabeças
chineses
blocos
arames
peças que finalmente se encaixam
numa espécie de ordem.
ela se dedica à questão
de modo matemático
resolve todos os seus
quebra-cabeças
vive perto do mar
põe açúcar para as formigas lá fora
e acredita
definitivamente
num mundo melhor.
seu cabelo é branco
raramente o penteia
seus dentes são podres
e ela veste macacões frouxos
e amorfos sobre um corpo que a maioria
das mulheres desejaria ter.
ao longo de muitos anos ela me irritou
com o que eu considerava suas
excentricidades:
como mergulhar conchas na água
(para que ao regar as plantas elas
recebessem cálcio).
mas finalmente quando penso na sua
vida
e a comparo a outras vidas
mais deslumbrantes, originais
e belas
percebo que ela machucou menos
gente do que qualquer outra pessoa que conheço
(e com machucar quero dizer simplesmente machucar).
ela enfrentou alguns momentos terríveis,
momentos em que talvez eu devesse tê-la
ajudado mais
porque era a mãe da minha única
filha
e uma vez fôramos grandes amantes,
mas ela havia superado essas dificuldades
como eu disse
das pessoas que conheço ela foi a que machucou
menos gente,
e se você olhar para isso pelo que isso significa,
bem,
ela criou um mundo melhor.
ela venceu.

Frances, este poema é pra
você.




Encurralado



não dispa o meu amor
você pode encontrar um manequim;
não dispa um manequim
você pode encontrar
o meu amor.

ela há muito tempo
me esqueceu.

ela experimenta um novo
chapéu
e parece mais
coquete
do que nunca.

ela é uma
criança
e um manequim

a morte.

não tenho como odiar
isso.

ela não faz
nada fora do
comum.

queria apenas que ela
fizesse.




Rompido



não há qualquer
justificativa
não há qualquer
mentira
qualquer verdade
qualquer amor... não há quaisquer
rebocadores, gatos, cães,
peixes,
céus.


até teu sofrimento é 
uma miragem.


não há qualquer contrato
não há qualquer honra
qualquer diretor,
e a razão foi
pescar no
deserto.

Para a puta que levou meus poemas


alguns dizem que deveríamos evitar remorsos particulares no

poema,

manter-nos abstratos, e há certa razão nisso,

mas jezus;

lá se vão doze poemas e eu não tenho cópias deles em carbono e você está com

minhas

pinturas também, as melhores; é sufocante;

quer me destruir como fez com todos os outros?

por que não leva meu dinheiro? é o que normalmente fazem com

os bêbados desacordados na esquina de quem batem os bolsos das calças.

da próxima vez leve meu braço esquerdo ou cinquenta contos

mas não meus poemas:

eu não sou Shakespeare

mas vai chegar um tempo em que simplesmente

não haverá mais nenhum, abstrato ou como quer que seja;

sempre haverá dinheiro e putas e bêbados

até a última bomba cair,

mas como Deus disse,

cruzando as pernas,

sei muito bem onde coloquei um bocado de poetas

mas não muita

poesia.




Jogue os Dados


se você for tentar, vá até o
fim.
caso contrário, nem comece.
se você for tentar, vá até o
fim.

isso pode significar perder namoradas,
esposas, parentes, empregos e
talvez sua sanidade.
vá até o fim.

isso pode significar não comer por 3 ou
4 dias.
isso pode significar congelar num
banco de parque.
isso pode significar prisão,
isso pode significar descaso,
gozação,
solidão.
solidão é uma dádiva,
todo o resto é uma prova de sua
perseverança, do
quanto você realmente quer
fazer isso.
e você irá fazer
apesar da rejeição e das
piores probabilidades
e será melhor do que
qualquer outra coisa
que você possa imaginar.

se você for tentar,
vá até o fim.
não existe nenhuma outra sensação
parecida.
você ficará a sós com os
deuses
e as noites se farão em chamas com o
fogo.

faça, faça, faça.
faça.

até o fim
até o fim.

você conduzirá a vida direto à
risada perfeita, é
a única batalha
pela qual vale a pena lutar.





A tragédia das folhas


despertei para a aridez e as samambaias estavam mortas,

as plantas nos vasos, amarelas como milho;

minha mulher partira

e as garrafas vazias como cadáveres exangues

cercavam-me com sua inutilidade;

o sol seguia bem, no entanto,

e o bilhete da minha senhoria se quebrava num belo e

resignado tom de amarelo; o que se precisava agora

era de um bom comediante, ao velho estilo, um bobo da corte

com piadas sobre a dor absurda; a dor é absurda

porque ela existe, quando nada mais;

A bela jovem passando pelo cemitério


paro meu carro no semáforo
vejo-a passando pelo cemitério –
enquanto ela segue junto à grade de ferro
posso ver para além das barras
vejo as lápides
e o gramado verde.
o corpo dela se mexe em frente à grade de ferro
as lápides não se mexem.

penso,
será que mais alguém vê isso?

penso,
será que ela vê essas lápides?
se vê,
ela possuiu uma sabedoria de que não disponho
pois parece ignorá-las.

seu corpo se move com
mágica fluidez
e sua longa cabeleira é iluminada
pelo sol das 3 da tarde.
o sinal muda
ela cruza a rua na direção oeste
dirijo para oeste.
sigo costeando o oceano
desço
e corro pra lá e pra cá
em frente ao mar por 35 minutos
vendo pessoas aqui e acolá
com olhos e ouvidos e dedos
e várias outras partes.

ninguém parece se importar.




Chopin Bukowski


este é meu piano.

o telefone toca e as pessoas perguntam,
o que você está fazendo? que tal
encher a cara com a gente?

e eu digo,
estou ao piano.

o quê?

desligo.

as pessoas precisam de mim. eu as
completo. se não podem me ver
por um tempo ficam desesperadas, ficam
doentes.

mas se as vejo muito seguido
eu fico doente. é difícil alimentar
sem ser alimentado.

meu piano me diz coisas em
troca.

às vezes as coisas estão
confusas e nada boas.
outras vezes
consigo ser tão bom e sortudo como
Chopin.

Oh yes



há coisas piores do que
estar só
mas costuma levar décadas
até que o percebamos

e frequentemente
quando o conseguimos
é tarde demais

e nada pior
do que
ser tarde demais.

Outra cama


outra cama
outra mulher

mais cortinas
outro banheiro
outra cozinha

outros olhos
outro cabelo
outros
pés e dedos.

todos à procura.
a busca eterna.

você fica na cama
ela se veste para o trabalho
e você se pergunta o que aconteceu
à última
e à outra antes dela...
é tudo tão confortável –
esse fazer amor
esse dormir juntos
a suave delicadeza...

após ela partir você se levanta e usa
o banheiro dela,
é tudo tão intimidante e estranho.
você retorna para a cama e
dorme mais uma hora.

quando você vai embora é com tristeza
mas você a verá novamente
quer funcione, quer não.

você dirige até a praia e fica sentado
em seu carro. é quase meio-dia.

– outra cama, outras orelhas, outros
brincos, outras bocas, outros chinelos, outros
vestidos

        cores, portas, números de telefone.

você foi, certa vez, suficientemente forte para viver sozinho.
para um homem beirando os sessenta você deveria ser mais sensato.

você dá a partida no carro e engata a primeira,
pensando, vou telefonar para Janie logo que chegar,
não a vejo desde sexta-feira.


Cavalo-marinho


tenho a indicação de um cavalo
tenho a barriga dele e seus culhões
tenho isso
o modo como vira os olhos
como come o feno
e como caga e
como dorme em pé

ele é meu
esta máquina
como um trem azul com que eu brincava
quando minhas mãos eram menores
e minha cabeça melhor

possuo este cavalo,
algum dia vou cavalgar
por todas as ruas
pelas árvores passaremos
subindo a montanha
e vale abaixo

o assinalamento e os olhos e colhões
nós dois
vamos aos lugares onde os reis de alimentam
de margaridas*
no mar gigante
onde pensar não é nenhum erro
onde os olhos não vão para a rua
como crianças de sábado à noite

o cavalo que possuo e o eu que possuo
ficaremos azuis maravilhosos e limpos
de novo

e eu sairei e
esperarei por você.


*No original Dandelion, "Dente-de-leão" . (NT)





Sandra


é a alta e magra
donzela do quarto
de brincos
coberta por um longo
vestido

está sempre alta
em sapatos de salto
espírito
boletas
trago

Sandra se inclina
em sua cadeira
inclina-se em direção a
Glendale

aguardo que sua cabeça
bata na maçaneta
do guarda-roupa
enquanto ela tenta
acender
um novo cigarro num
outro já quase
consumido

aos 32 ela gosta de
jovens limpos
imaculados
com rostos semelhantes ao fundo
de pires recém-comprados

depois de se vangloriar
a não mais poder
acabou me trazendo seus prêmios
para que eu desse uma olhada:
garotos nulos, loiros e silenciosos
que
a) sentam
b) levantam
c) falam
ao seu comando

às vezes ela traz um
às vezes dois
às vezes três
para que eu os
veja

Sandra fica muito bem em
vestidos longos
Sandra pode partir provavelmente
o coração de um homem

espero que ela encontre
um.


A garota no banco da parada de ônibus


eu a vi quando eu estava na pista da esquerda
indo a leste pela Sunset
ela estava sentada
as pernas cruzadas
lendo um livro de bolso.
era italiana ou indiana ou
grega
e enquanto eu estava parado no sinal vermelho
vez ou outra um vento
erguia sua saia,
eu tinha a visão desimpedida,
revelando
pernas da mais imaculada perfeição
que eu jamais vira.
sou essencialmente tímido
mas olhei e fiquei olhando
até que uma pessoa no carro atrás de mim
começou a buzinar.

isso nunca tinha acontecido dessa
maneira.
dei a volta na quadra
e estacionei numa vaga do
supermercado
bem em frente ao lugar em que ela estava
de óculos escuros
eu não deixava de olhar
como um colegial em sua primeira
excitação.

memorizei seus sapatos
seu vestido
suas meias
seu rosto.

os carros passavam e me bloqueavam
a visão.
então eu a via novamente.
o vento erguia sua saia
para muito além das coxas
e comecei a me tocar.
um pouco antes do ônibus dela aparecer
cheguei ao orgasmo.
senti o cheiro do meu esperma
sua umidade em meu calção
e cueca.

era um ônibus branco e feio
e a levou embora.

dei a ré no estacionamento
pensando, eu sou voyeur pervertido
mas ao menos não me
expus.

sou um voyeur pervertido
mas por que elas fazem isso?
por que têm essa aparência?
por que deixam o vento soprar
assim?

ao chegar em casa
tirei a roupa e fui para o banho
saí enrolado na
toalha
liguei
as notícias
apaguei as notícias
e
escrevi este poema.

Aids


os dias tranqüilos de sexo se foram,
o sexo está quase liquidado
aqui na terra
a menos que eles curem
o que está nos
matando.

os jovens nunca saberão
como íamos destemidos
de cama em cama
de corpo em corpo
noite após noite.
tudo isso, às vezes, se tornava
um tédio.

me pergunto o que vamos perder
em seguida?

tem sido um inferno
esse meio-século:
primeiro a bomba atômica,
agora
isso.

chegou a hora de uma invasão de
alienígenas do espaço.

e eles podem muito bem

ficar
com
tudo.



462-0614


agora recebo muitas chamadas de telefone
todas iguais
"é Charles Bukowski,
o escritor?"
"sim", eu lhes respondo.
e eles dizem que entendem minha
escrita,
alguns deles são escritores
ou querem ser escritores
e estão em empregos estúpidos e
horríveis
e não conseguem nem encarar a sala
o apartamento
as paredes
essa noite...
querem alguém com quem possam
conversar,
não podem acreditar
que não posso ajudá-los
que não conheço as palavras.
não podem acreditar
que agora mesmo
me dobro em meu quarto
segurando minhas entranhas
e dizendo
"Jesus Jesus Jesus,
de novo não!"
eles não podem acreditar
que as pessoas mal-amadas
as ruas
a solidão
as paredes
também são minhas.
e quando desligo o telefone
eles acham que escondi o
jogo.

não escrevo a partir da sabedoria.
quando o telefone toca
eu também gostaria de ouvir palavras
que pudessem aliviar um pouco alguma 
dessas coisas.

é por isso que meu nome está na
lista.

Minha


Ela jaz ali embolada.
Posso sentir a grande montanha vazia
de sua cabeça
mas ela está viva. Boceja e
coça o nariz e
puxa para si as cobertas.
Logo lhe darei o beijo de boa-noite
e nós vamos dormir.
E longínqua é a Escócia
e embaixo da terra
correm os roedores.
Ouço motores na noite
e pelo céu rodopia uma
branca mão:
boa noite, querida, boa noite.

O amor é uma folha de papel rasgada em pedaços



toda a cerveja estava envenenada e o cap. soçobrou
e o imediato e o cozinheiro
e não tínhamos ninguém pra manejar as velas
e o noroeste dilacerou os panos como unhas
e nós arfávamos que era uma loucura
o casco se rasgando nas laterais
e o tempo todo no canto
um merda qualquer comia uma cadela bêbada (minha esposa)
e socava tranquilo
como se nada estivesse acontecendo
e o gato não parava de olhar para mim
e de rastejar na despensa
em meio aos pratos estrepitosos
com flores e videiras pintadas neles
até que não aguentei mais
e peguei a coisa
e a lancei
pela
borda. 

Pessoas como flores


que cantoria prossegue nas

ruas –

as pessoas parecem flores

finalmente

a polícia guardou suas

insígnias

o exército rasgou seus uniformes e

destroçou suas armas. não há mais necessidade de

cadeias ou jornais ou hospícios ou

trancas nas portas.

Lamentando e se queixando


ela escreve: você vai
se lamentar e se queixar
em seus poemas
sobre como eu trepei
com 2 caras na semana passada.
eu te conheço.
ela escreve para me
dizer que meu sensor
estava certo -
ela recém tinha trepado
com um terceiro cara
mas ela sabe que não
quero saber com quem, nem por que
nem como. ela encerra sua
carta, "com amor".

ratos e baratas
triunfaram novamente.
aí vem ele correndo
com uma lesma em sua
boca, entoando
velhas canções de amor.
feche as janelas
lamente
feche as portas
queixe-se.

Eu


mulheres não sabem como amar,
ela me disse.
você sabe como amar
mas mulheres só querem parasitar.
sei disso porque sou
mulher.

hahaha, eu ri.

por isso não se preocupe terminando
com Susan
porque ela apenas irá parasitar
outro homem.

falamos um pouco mais
então me despedi
desliguei o telefone
fui ao banheiro
e mandei uma boa merda de cerveja
basicamente pensando, bem,
continuo vivo
e tenho capacidade de expelir
sobras do meu corpo.
e poemas.
e enquanto isso acontecer
serei capaz de lidar com
traição 
solidão
unhas encravadas
gonorréia
e o boletim econômico do
caderno de finanças.

com isso
me levantei
me limpei
dei a descarga
e então pensei:
é verdade:
eu sei como
amar.

ergui minhas calças e caminhei
para a outra peça.

O amor é um cão dos diabos


pé de queijo
alma de cafeteira
mãos que odeiam tacos de bilhar
olhos como clipes de papel
eu prefiro vinho tinto
entedio-me em aviões
sou dócil durante terremotos
sonolento em funerais
vomito nos desfiles
e vou para o sacrifício no xadrez
e nas bocetas e nos afetos
cheiro urina nas igrejas
já não consigo mais ler
já não consigo mais dormir

olhos como clipes de papel
meus olhos são verdes
prefiro vinho branco

minha caixa de camisinhas está passando da
validade
eu as tiro pra fora
Trojan-Enz
lubrificadas
para maior sensibilidade
tiro todas pra fora
e ponho três ao mesmo tempo

as paredes do meu quarto são azuis

para onde você foi, Linda?
para onde você foi, Katherine?
(e Nina partiu Inglaterra)

tenho cortadores de unha
e limpa-vidros Windex
olhos verdes
quarto azul
brilhante metralhadora solar

essa coisa toda é como uma foca
presa em oleosas rochas
e cercada pela Banda Marcial de Long Beach
às 3h36 da tarde

há um tiquetaquear atrás de mim
mas nenhum relógio
sinto algo rastejar
ao longo de minha narina esquerda:
memórias de aviões

minha mãe tinha dentes postiços
meu pai tinha dentes postiços
e durante todos os sábados de suas vidas
eles recolhiam todos os tapetes de sua casa
enceravam o chão e de tabuões
e o cobriam novamente com os tapetes

e Nina está na Inglaterra
e Irene está no abrigo municipal
e eu pego meus olhos verdes
e me deito me meu quarto azul

Amor à primeira puta


Julia das GRANDES pernas 
que nunca dizia nada 
apenas ficava sentada lá 
bebendo
cabeça baixa,
uma verruga grande na mão esquerda, 
jogando cinza de cigarro por todos os lados, 
então,
vez ou outra
levantando a cabeça e pronunciando 
de uma maneira profunda
(parecia pra mim, pelo menos) 
a palavra
"MERDA!„
isso respingava nas paredes e espelhos e 
em mim e eu pensava, olhando praquelas 
grandes pernas, que eu realmente gostaria 
de conhecer essa mulher.

Em algum lugar é meia-noite e quarenta e um


a soprano canta no meu rádio 
nesta noite vermelha e rubra 
e o céu esfolado em 
carne viva. 
mordo um palito de dentes e aspiro a 
imortalidade. 
é tudo tão razoável e tão terrível, é tudo tão 
terrivelmente razoável. 
imagine, eu nunca estive em Londres. 
fico aqui sentado com meus chinelos grossos e macios e 
medito sobre isso. 
mas não por muito tempo nesta 
noite vermelha e rubra. 
sabe, eu poderia deixar facilmente que 
os monstros tomassem meus 
miolos, 
mas uma vez que você os deixa entrar, tirá-los 
é quase 
impossível. 
agora a soprano se foi. 
agora um barítono. 
ele canta para mim sobre esta noite escura e 
negra. 
ele parece estar preso entre 
paredes vermelho-escuras. 
mudo de posição na cadeira, cuspo fora o 
palito. 
noite escura e negra. 
noite vermelha e rubra. 
meus pé caminham na poeira 
cósmica 
e a tolice 
sobrevive.

Até


temos que viver com a derrota e
talvez jogar
com uma mão ruim

e

sabemos o tempo todo qual é o placar.
encaramos de frente como Hemingway
ou deixamos de lado como
Camus
mas sabemos que
sabemos.

é assim que funciona e
damos corda nos nossos relógios e
esperamos pela

meia noite ou pelo carnaval
pelo hambúrguer ou pelo
catador de lixo.

vivemos com isso e vivemos com isso até

morrermos.

Riso secreto


a toca da casa fica
escondida no último lugar
em que você olharia
e mesmo que você encontre
você não acreditará
que está mesmo lá
da mesma forma
que uma pessoa medíocre
não acreditará em um grande quadro.

Resposta a um estudante de segundo ano da Filadélfia


não se preocupe com meu
poema:

mais tarde
haverá outras
coisas
lá fora

muito piores
do que
meus textos que
você leu
na aula.

Becapes


nesta era moderna de relacionamentos
de amor/sexo
nós todos somos muito espertos.

caso a gente não dê certo, ela me diz,
eu tenho 4 becapes.

4? bem, isso é bom, digo.

quantos você tem? ela pergunta.

bem, agora - 

uma e
duas e, ah, tem, sim, 3,
e uma em Berkeley, são 4,
e tem sim, tem
5. 5,, é
isso.

fito seus olhos.

ela pestaneja.